‘Existencialismo Cristão’
“Pois
nele vivemos, nos movemos e existimos’, como disseram alguns dos poetas de
vocês: Também somos descendência dele” (At
17.28).
Os nossos dias estão confusos e coisa alguma parece
ser o que de fato é. A ditadura do relativismo nos carrega a todos numa enxurrada
de desconstrução da realidade jogando impiedosamente a nossa geração num vácuo
existencial, sem referenciais, sem absolutos morais, sem certo ou errado, sem
padrões definidos. Em tempos como os nossos a desesperança e o desespero
parecem ser o tempero predominante da alma. Muitos são os sintomas de nossa
sociedade doente, o avanço das drogas e do álcool assolando famílias inteiras,
abreviando absurdamente as vidas dos mais jovens. Uma geração inteira de
“lesados” cresce bem à nossa vista. Potenciais que são desperdiçados, a força
de trabalho que desaparece, ideologias e sonhos que são destruídos e vidas que
são tornadas inúteis e alienadas da realidade. Cresce assustadoramente o índice
de suicídios entre jovens e adolescentes, é um crescimento invisível, não há
interesse em quantificar e demonstrar através de uma pesquisa séria, a mídia
não tem interesse em noticiar, mas o fato está posto. Nossos filhos estão
perdendo cada vez mais cedo o sentido da vida, a esperança quanto ao futuro e o
sonho de um mundo melhor já não é assim tão acalentado por eles. Outro sintoma
é a crise de autoridade e legitimidade das associações de classes, entidades
políticas, Igrejas e religiões e até mesmo no esporte, com raríssimas exceções,
quase não encontramos alguém que nos transmita confiabilidade. A corrupção
grassa e permeia as entranhas de nossa sociedade minando os recursos que
poderiam melhor a qualidade de vida de todos, de maneira especial dos mais
vulneráveis. Nossas vidas correm perigos em hospitais, nossos direitos nem sempre são
adequadamente defendidos por quem deveria promover e defender a justiça. Nosso
direito de ‘ir e vir’ está seriamentecomprometidos
com a endêmica falta de segurança. E os políticos, bom os políticos...Neste
contexto palidamente constatado aqui não há como não sentir um pouco de náusea,
de absurdidade, de desconforto existencial e não há como não lembrar de Albert
Camus, Jean Paul Sartre e etc. Todavia, o cristianismo não é pessimista.
Não é pessimista porque sabemos que as coisas podem até estar fora de nosso
controle, podem até não fazer muito sentido e podemos até ter a sensação que
vivemos o Mito de Sízifo e que o nosso esforço parece vão. Mas, se não estamos
no controle, Deus está! Desde o trono Ele governa todas as coisas e com um
propósito santo e sábio. Não cremos num Deus que tenha criado este
mundo sem a menor noção do que fazer com Ele ou de como administrá-lo. Não
mesmo. Nosso Deus permite estas coisas com um propósito bem definido em sua
mente nem sempre alcançado pela nossa. Mas, acaso e caos desgovernado não há. O
cristianismo também não é otimista. Sim, não achamos que tudo vai melhorar
naturalmente, ou mesmo sobrenaturalmente de uma hora para outra. Não cremos que
é apenas uma fase ruim, uma ‘marolinha’, que logo tudo se acerta. Claro que não.
Temos os nossos pés bem fincados na história e na realidade. O cristianismo é
realista. Não há religião, filosofia ou ideologia mais realista que o
cristianismo. Não cremos no paraíso terrestre forjado e conquistado pelas
revoluções e pelas lutas de classes. Até reconhecemos a sua importância
histórica. Não cremos em utopias de espécie alguma. Temos o pé na realidade
histórica. Sabemos que a corrupção de toda natureza e que toda torpeza de que o
homem é capaz de cometer. Não ignoramos que toda opção errada, toda falta de
bom senso, equilíbrio e justiça têm a mesma origem, o coração depravado e não
regenerado do homem. Que o homem não poderia projetar e construir nada
diferente do que aí está. Sabemos também que Deus não é o Deus de José
Saramago, aquele “Ser Supremo” que se existe é irrelevante e que fechou as
portas da eternidade atrás de si e foi dar um passeio contemplativo pelos
confins do universo deixando os homens e a criação à sua própria sorte. Não! Deus
age por meio de sua Graça Comum ou Geral e dota todos os homens, quer creiam
nele ou não, sejam cristãos ou não, mas a todos Ele enriquece com dons e
habilidades. Estes dons da Graça Comum são aqueles que arrefecem e
atenuam os efeitos nefastos do pecado e da desesperança e nos permitem avançar
no meio do caos. Desta Graça Comum surgem o Estado para promover o Bem, as Artes para fomentar
o Belo, as Ciências para exaltar a Verdade, a Tecnologia para humanizar a Vida
e defendê-la e assim, toda conquista humana honrosa tem a mesma fonte que o da Salvação dos que creem: Deus.
Como
dizia a minha avó diante de uma barbaridade, “o mundo precisa de Deus”, quer
saiba disso ou não. Quer aceite isso ou não. Quer acredite nisso ou não!
Rev. Luiz
Fernando Dos Santos -
É Ministro da Igreja Presbiteriana do Brasil em Itapira
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