Eucaristia e Missão
“Fazei isto
em minha memória” (Lc 22.19 b).
A compreensão da natureza e do lugar da Eucaristia
na vida da Igreja Evangélica ainda é muito pobre. No afã de nos precavermos de
certos exageros praticados em outras confissões, nós protestantes,
infelizmente, esvaziamos quase por completo o sentido da Eucaristia,
relegando-a muitas vezes a uma simples recordação do que Jesus fez. Quase
transformamos a Eucaristia num arremedo de teatro sem vida e sem graça.
Entretanto, a riquíssima Tradição da Igreja desde Atos dos Apóstolos, passando
pelos pais apostólicos, a era patrística grega e latina até o final do século
VII desenvolveram a teologia da Eucaristia com implicações sobre todas as
dimensões da vida da Igreja, desde o culto, a ética pessoal e comunitária, a
piedade pessoal, a caridade social e efetivamente as missões. Nas épocas
citadas acima, a Eucaristia não era o centro do culto cristão. Cristo e a sua
Palavra sim. Mas, a Eucaristia estava no centro, não havia ajuntamento solene
onde depois do nutrimento do pão da Palavra não houvesse também o nutrimento
sacramental que tipificavam o sacrifício da cruz: Pão e Vinho
eucaristizados. Precioso é testemunho
que recebemos do Novo Testamento: Atos dos Apóstolos e algumas epístolas
Paulinas aludem à reunião semanal de partir o pão. Também os documentos
conservados na história da Igreja: A
didascalia Apostólica, a Didaqué, a Tradição de Hipólito, a Tradição de
Justino, A Liturgia de Jacó Baradai e os muitos cânones conciliares
antiquíssimos atestam a vivência de uma Igreja Eucarística. Dando um salto na
história, os Reformadores se viram às voltas com o conceito, a realidade e a
prática da Ceia do Senhor. Três grandes ramos surgiram e permanecem desde então
influenciando os herdeiros da Reforma: A
Tradição Luterana, a Escola Calvinista e a posição de Ulrico Zwinglo.
Há ainda a Tradição
Anglicana que conservou-se apenas e tão somente nos limites de suas
ramificações e de sua comunhão espiritual. Lutero modificou levemente a Missa, fazendo
apenas ajustes e uma espécie de enxugamento e expurgo de elementos que não eram
claramente bíblicos. Zwinglio foi o mais radical. Esvaziou quase completamente
a Ceia de gestos, sinais e gênio litúrgico. Aboliu inclusive o canto
congregacional e o uso de instrumentos musicais no culto e relegou a celebração
da Ceia, da Eucaristia, a poucas ocasiões no ano, quatro para ser mais exato.
Calvino buscou o meio termo entre as Tradições de sua época. Foi mais longe que
Lutero, modificou também a natureza, o conceito, e uniu de vez a validade e a
liceidade do sacramento com a pregação da Palavra. Calvino foi mais
generoso e fiel à Tradição Neotestamentária e Patrística que Zwinglio. Desejou
preservar a Eucaristia na reunião semanal dos cristãos e ainda estabeleceu uma
ordem do culto que, conquanto preservasse a simplicidade do culto sob o
Evangelho, conservou espaço para a solenidade, a gravidade e o gênio litúrgico,
sem estabelecer uma regra fixa. Nós, presbiterianos, ligados mais estreitamente
à escola de Calvino possuímos esta compreensão do sacramento como um selo que
confirma e pela fé aplica as promessas da Palavra de Deus, enquanto nutre a fé
e comunica graças aos corações crentes. Mas, há outra dimensão da Eucaristia
que devemos recuperar. É a dimensão missionária da celebração da
Ceia. Toda assembleia eucarística é uma reunião de proclamação, é uma reunião
querigmática que aponta para a verdade da cruz e para a realidade da
ressurreição. Quando nos reunimos para fazer memória adorante da obra
da redenção consumada por Cristo somos visitados pela consciência de que esta
verdade não pode ser confinada ao recinto do culto. Precisamos levá-la para o
centro de nossas vidas pessoal e comunitária. Em cada Ceia damos testemunho
do gesto de amor sacrificial de Jesus e o assumimos como nosso, como nossa
missão de discípulos. Nos reconhecemos neste gesto de partir o pão e beber do
cálice como vocacionados a sermos a memória vivente do Senhorio de Jesus Cristo
no mundo. A Eucaristia não é só um privilégio, um meio de graça, mas um
compromisso, uma convocação para vivermos a missão de Cristo de dar a nossa
vida, de amar até as últimas consequências como crentes individualmente e como
Igreja em Itapira. A Eucaristia foi entregue à Igreja para ser celebrada entre a
Ascensão e a Parúsia, ou seja, no tempo das Missões. Enquanto anunciamos, pregamos, discipulamos,
servimos à Igreja e servimos no mundo,
“sempre que comemos deste pão e bebemos deste cálice anunciamos
a morte do Senhor até que ele venha” (1Co 11.26).
Rev. Luiz Fernando - Pastor da IPCI
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