O poder do testemunho
“Os que haviam
sido dispersos pregavam a palavra por onde quer que fossem” (Atos 8:4).
Em menos de 300 anos o cristianismo, que começou como
um movimento dentro do judaísmo, doze homens em treinamento intensivo aos pés
de um Mestre e ainda quase uma centena de outros seguidores e discípulos com
níveis diferentes de comprometimento, conquistou praticamente o Mediterrâneo e
a totalidade do Império Romano. Nesse período de vertiginoso crescimento é de
se esperar que tempos de paz, muito incentivo e apoio cultural e político, bem
como a influência de pessoas poderosas contribuíssem diretamente para tal
sucesso. Também poderíamos esperar que a todo o tempo, os membros desse
movimento contassem com a liderança sempre proficiente de líderes bem formados
e profissionais. Mas, nada disso aconteceu, pelo menos não o tempo todo e em
todos os lugares. Na verdade, tudo corroborou, debaixo da providência divina, para que o
Evangelho se movimentasse em todas as direções, o tempo todo, em todas as
camadas sociais. Deus serviu-se de perseguições religiosas, perseguições e
intolerâncias culturais e políticas, guerras, epidemias, tráfico de escravos e
muitas outras situações para colocar em ação o seu plano de estabelecer Cristo
como Rei e Senhor de muitíssimas vidas. O mais impressionante que nem
sempre o Evangelho chegou com um missionário especialmente para isso
comissionado. E isso, ainda nos tempos apostólicos. Na esmagadora maioria das
vezes o Evangelho foi levado no meio dos poucos pertences de uma fuga às
pressas em tempos de perseguição. Outras vezes foi recebido entre os espólios
de uma guerra e foi introduzido quase imperceptivelmente pelos expatriados,
exilados e escravizados onde quer que seus novos ‘senhores’ os haviam enviados.
O impacto do Evangelho nesse período até Constantino (313) e também depois dele
até quase o século V teve como principais obreiros, soldados,
mercadores, teve
como principais obreiros, soldados, mercadores, empregados domésticos,
servidores públicos, artesãos, mascates, donas de casa e escravos. Os
principais púlpitos eram os mercados, as esquinas, as casas públicas de banho,
os escuros, úmidos e insalubres aposentos dos empregados e escravos e as
masmorras. A estratégia era uma
só, não perder tempo e nem oportunidade para falar de Jesus Cristo e de viver
uma nova ética em meio ao seu contexto vital. As rotas comerciais, as
impressionantes estradas da “Pax Romana”, a incessante movimentação dos povos e
as rotas migratórias e o gigantesco deslocamento de tropas do exército romanos
e suas legiões formadas por bárbaros vencidos e recrutados, propiciou um
encontro internacional e multiétnico que favoreceu a disseminação da fé cristã
entre povos, línguas e raças numa escalada impossível de ser planejada com
antecedência. Assim, através do encontro pessoal, dos relacionamentos sociais,
do testemunho intencional e apaixonado e da “tradição oral”, Jesus Cristo foi
apresentado como único e suficiente salvador, Aquele único que pode dar sentido
à essa vida, conforto na morte e certeza da imortalidade. Não são poucos os
casos de grandes conversões ou conversões de pessoas ilustres e influentes que
se deram através do comportamento casto, nobre, honesto, sempre magnânimo,
gentil, manso e corajoso dos cristãos, cuja função nem sempre passava de
insignificante e trivial serviço doméstico. O corajoso testemunho dos cristãos
nas arenas diante das feras, ou no cadafalso diante de seus algozes, a
serenidade sob a falsa acusação de um tribuno, sempre causou fortíssima
impressão, mesmo nos inimigos da fé. Evidentemente que mais tarde, quando
comunidades surgiam da força deste testemunho pessoal e a igreja começava a sua
vida, foi preciso a participação de missionários, pastores, evangelistas com
especial comissão e conhecimento para agregar valor, profundidade, solidez e
racionalidade à novíssima fé dos recém-convertidos. Entretanto, uma lição pode
e deve ser aprendida por nós em pleno século XXI. Nada substitui a força dos
relacionamentos sociais, o contato real, corpo a corpo, e a convivência com
pessoas de fora de nossos arraiais, para o crescimento do Evangelho. Não há
estratégia que possa suplantar o intencional testemunho de um cristão em
ambiente hostil, indiferente e até zombador da fé. Os discursos são
necessários, claro. Somos a religião da Palavra. Nosso Deus é o Deus da Palavra
e é por meio dela que Ele se comunica conosco. Todavia, Palavras sem
testemunho, sem comportamento, sem procedimento ético é uma Palavra ao vento. O
mundo precisa outra vez ser impressionado pela vida dos cristãos.
Impressionar-se vendo-nos no dia a dia, no cumprimento de nossas obrigações, na
substancial diferença que marca os nossos relacionamentos. Que o nosso
testemunho seja outra vez irresistível e queira Deus marcar outras vidas por
nossas vidas marcadas por Ele.
Reverendo Luiz Fernando
é Ministro da Palavra na Igreja Presbiteriana
Central de Itapira
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