Para que serve o Pastor?
“Quanto a nós,
nos consagraremos à oração e ao ministério da palavra” (At 6.4).
Essa é uma pergunta da qual não podemos mais nos
esquivar em nosso tempo. Há muito o ministério pastoral está em descrédito na
sociedade e na própria igreja. Muitos são os fatores para que isso tenha
acontecido, e aqui, não é o melhor lugar para se tratar do assunto. Recomendo,
entretanto, a obra de Kevin Vanhoozer, “O Pastor como Teólogo”, que trata com
precisão cirúrgica e muita clareza das causas que levaram ao desprestígio do
mais nobre ofício já concedido aos homens. Hoje gostaria apenas de propor uma
rápida consideração do assunto para a nossa reflexão comunitária. Uma
das fortes razões para o descrédito dos ministros, evidentemente, tem a ver com
uma grave crise de identidade espiritual e funcional. Quanto a
identidade espiritual os pastores já não se entendem como homens encarregados
dos mistérios de Deus e despenseiros da multiforme graça de Deus. Confundiram
os títulos e os cargos, com a natureza espiritual de seu ofício. Assim,
ser pastor e ou reverendo parece pouco. Ser tratados e chamados de bispos já
não contenta a ninguém. Querem se fazer passar por patriarcas, profetas e agora
apóstolos. Tenho até medo de cogitar o que poderá vir a seguir.
Todavia, olhando para o Novo Testamento, encontramos a identidade espiritual do
pastor. Um pecador redimido que foi comissionado por Deus para lidar com as
questões mais essenciais da vida. Um homem pecador, em processo de
santificação, que foi alçado à perigosa condição de discípulo modelo do
rebanho. Sim, os pastores são chamados a viver e a servir de padrão de conduta,
de modelos espirituais e morais, de espelhos através dos quais a imagem de
Cristo se reflete no mundo. Facilmente nos esquecemos do que o próprio
Paulo ensinou a respeito: “Ninguém
despreze a tua mocidade; mas sê o exemplo dos fiéis, na palavra, no trato, no
amor, no espírito, na fé, na pureza” (1 Tm 4.12); “Conserva o modelo das sãs palavras que de mim tens ouvido, na fé e no
amor que há em Cristo Jesus” (2 Tm 1.13); “Sede meus imitadores, como também eu de
Cristo” (1 Co 11.1); “Sede também
meus imitadores, irmãos, e tende cuidado, segundo o exemplo que tendes em nós,
pelos que assim andam” (Fp 3.17). Isso apenas para ficar nesses exemplos. O
pastor não é um super crente, mas deve ser alguém que busca viver com
radicalidade e paixão o seu seguimento de Cristo acima da média de seus irmãos.
Por isso o apóstolo Paulo pede ao jovem pastor de Timóteo e aos presbíteros em
geral que tenham muita atenção com a própria vida espiritual: “Medita estas coisas; ocupa-te nelas, para que
o teu aproveitamento seja manifesto a todos” (1 Tm 4.15); “Olhai, pois, por vós, e por todo o rebanho
sobre que o Espírito Santo vos constituiu bispos, para apascentardes a igreja
de Deus, que ele resgatou com seu próprio sangue” (At 20.28). E por que razão
os pastores devem dar a maior atenção para a sua vida com Cristo e a sua
identidade espiritual? Devido exatamente sua identidade funcional. Um pastor só
tem utilidade à sua igreja e à sociedade como um todo se um for um especialista
dedicado à oração e à Palavra. Essas duas atividades são o cerne de seu
ministério e delas decorrem todas as outras ações pastorais. O pastor é aquele
que como sacerdote deve comparecer muitas vezes e por muito tempo na presença
de Deus em favor do povo a quem ele serve. Deve interceder, pelejar em oração,
apresentar em forma de súplicas, clamores e lágrimas as demandas de seus irmãos
e filhos espirituais. A oração é a fonte de sua vitalidade, é donde emana o
poder para a sua pregação, a elasticidade para a sua longanimidade e paciência
e bem como a abundância de amor e misericórdia que deve demonstrar em nome de
Cristo, de quem é representante entre os homens. Também deve dedicar-se a
Palavra, na condição de profeta. Deve investir tempo de qualidade em leitura,
meditação, estudo, acurada exegese, uma fiel hermenêutica do texto Bíblico.
Deve dominar as sutilezas e a complexidade da doutrina, ser capaz de
identificar e combater erros e heresias. Não pode ignorar o espírito de sua
época, as nuances culturais e filosóficas, se quer mesmo entender os homens de
seu tempo e conseguir estabelecer conexão e diálogo frutífero com eles. Oração
e Palavra são as funções do pastor que servirão de grande utilidade para o
rebanho. Pois, a oração eleva a mente e o coração do pastor acima das trivialidades,
do pragmatismo, do minimalismo ético e moral e do utilitarismo coisificante do
mundo. A Palavra fornece o substrato intelectual, moral e espiritual
que nos faz enxergar a verdade de todas as coisas e refletir e a pensar a nossa
existência em relação à vontade de Deus. Uma falsa expectativa da igreja
desejando um pastor administrador, animador de palco, promotor de
entretenimento, psicólogo ou curandeiro certamente também contribuem e muito
para o descrédito do ministério pastoral. Em última palavra, os pastores são
úteis quando ensinam pela vida, pelo exemplo e por palavras como amar a Deus e
pensar e agir em nossas vidas do modo que agrade ao Senhor.
Reverendo
Luiz Fernando, por misericórdia de Deus,
é Ministro do Evangelho na Igreja
Presbiteriana Central de Itapira.
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