Misericórdia
“Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor
Jesus Cristo, Pai das misericórdias e Deus de toda consolação” (2 Coríntios
1.3).
Misericórdia é uma das mais belas palavras das Escrituras, mas também
uma das mais lindas em qualquer idioma.
Sua compreensão é tão rica que torna a explicação de seu sentido um
desafio e tanto para qualquer um. Na Bíblia, por exemplo, de maneira especial
no Antigo Testamento, ela diz respeito a uma ação de Deus que tem a ver com o
processo de gestar e dar á luz. A Bíblia usa a palavra “entranhas” para falar
deste ato curativo, restaurador e salvífico de Deus. Isto significa que quando Deus
usa de misericórdia um processo de recriação, de novidade de vida, de gestação
de uma nova natureza está a caminho. Deus não faz emendas, não cola o quebrado,
Deus não remenda o rasgado, não! Ele sempre faz novas todas às coisas
(Ap 21.5). A ação da misericórdia dá outra oportunidade, cria uma nova chance,
chama para outra orientação da existência e fornece um novo caminho para ser
seguido. Nesta nova condição o que é velho não tem lugar. Rancores, azedumes,
peso na consciência, vergonha, discriminação e senso de inadequação também não.
A misericórdia do Senhor é profundamente libertadora e promotora de vida e paz.
Onde a misericórdia triunfa sobre o juízo os relacionamentos são refeitos e se
tornam saudáveis. Onde a misericórdia abunda os laços familiares se tornam
indestrutíveis, o pacto nupcial é protegido, o lar torna-se uma fortaleza para
os filhos e um porto seguro para o casal. No ambiente onde a misericórdia é
cultivada as pessoas não precisam interpretar papéis, nem se esconder atrás de
máscaras ou fugir de quem são de fato. A misericórdia abraça a todos,
inclui a todos, encurta as distâncias
e dá segurança para que cada personalidade se desenvolva
e cresça como pessoa humana e filho de Deus. Conquanto a misericórdia nunca
possa ser usada como conivência, tolerância ou cumplicidade com o pecado, ela
nunca marginaliza ou abandona o pecador. Na misericórdia há sempre um
convite gracioso e um apelo amoroso para a conversão e o abandono do mal.
Vivemos todos numa sociedade julgadora, medrosa, acusadora e indiferente. O
discurso do politicamente correto, os apelos para uma tolerância com base nas
leis ou nas garantias das liberdades e das minorias não surtem todo o efeito
esperado. Mesmo a educação, por mais imprescindível, não consegue atingir os
seus fins. Isso não quer dizer que devamos desistir, claro que não. Antes,
todos temos a obrigação de nos envolver na construção de uma sociedade mais
pacífica, mais inclusiva e mais humana. Contudo, há uma parcela da humanidade
que já vive e deveria apresentar a todos o que significa viver sob a ‘lei’ da
misericórdia. Essa parcela da humanidade é a Igreja, lugar onde todos já
experimentaram a misericórdia para todos os tipos de males e pecados. Na
igreja, todos foram acolhidos por Cristo e n’Ele pelo Pai das misericórdias
para sermos justamente libertados, renovados, recriados. Numa palavra, salvos.
Na igreja, por causa do transbordamento da misericórdia por meio da cruz, já
não existem diferenças e rivalidades excludentes. A misericórdia nos fez
entender que não precisamos mais buscar a felicidade a qualquer preço e nem nos
aprisionar em nossos desejos desenfreados. Agora, entendemos que nossa nova
condição nos habilitou para o que é bom, justo, nobre, santo e aprendemos a
honrar a Deus em nossos corpos, com os nossos bens e por meio do que fazemos
para sobreviver, porque tudo foi tocado e transformado pelas entranhas de
misericórdia de nosso Deus. Precisamos todos nos matricular na escola da
misericórdia para exercê-la neste mundo doente e nesta sociedade infeliz. É
preciso agir com misericórdia com o meio ambiente agredido e vilipendiado pela
ganância. Agir com misericórdia para que este sistema econômico não marginalize
e destrua a dignidade de homens e mulheres cada vez mais presentes em nossas
ruas vítimas da miséria, da ignorância e dos vícios. O mundo ainda que não
saiba, precisa de misericórdia e não há de encontra-la, a menos que a igreja a
faça brilhar como o sol em zênite a fim de que as trevas que pairam sobre os
corações desapareçam e um mundo
novo surja nascido das entranhas
da misericórdia de nosso Pai.
Reverendo Luiz Fernando
Ministro da
Igreja Presbiteriana Central
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