Luthero e a Reforma
Protestante
“Conhecerão a verdade, e a verdade os
libertará” (Jo 8.32).
Muito se tem dito a
respeito do contexto histórico da Reforma Protestante. Às vezes até com certo
exagero se pinta o século XVI como um período de que nada se aproveita na
religião, na igreja, na cultura e nas artes. Não é esta bem a verdade. O Século
XVI viu nascer o período da Renascença, um tempo de retorno às fontes
culturais, intelectuais, filosóficas e estéticas da antiguidade greco-romana,
grosso modo. Também vultos intelectuais de um passado bem próximo iluminavam a
Igreja Romana, como Boaventura, Pedro Lombardo, Tomás de Aquino, Anselmo e etc.
De fato a identificação dos poderes temporais e espirituais desde o Sacro
Império Romano Germânico, a corrupção da cúria romana e os despotismos de papas
e bispos, bem como o lento e trágico afastamento das Escrituras, levaram a
Igreja a um estado desesperador de
obscurantismo. Nas palavras de um teólogo católico, Loius Boyer, “mesmo a
pérola do Evangelho já não brilhava mais, escondida sob as camadas e camadas de
demãos de tingimento da Tradição.” Neste contexto emerge a figura de Martinho
Luthero. Sem muito discernimento e sem conhecimento da vontade de Deus nas
Escrituras, Luthero, em dia de grande tempestade faz o voto à Santana, mãe de
Maria, segundo a Tradição, que se escapasse com vida daquela tormenta se
consagraria a Deus na vida monástica. Luthero passou seus dias no mosteiro
atormentado em sua alma. Chegou mesmo a admitir que odiava um Deus justo. E,
por mais que se confessasse com seu diretor espiritual J. Stauptz, ou fizesse
penitência e muitas vigílias, sua alma jamais encontrava paz e sim a lembrança
de um Deus insatisfeito, irado, justo, vindicando justiça. De fato, este Deus
existe, é revelado nas Escrituras, é o Deus da Bíblia. Contudo, não é a revelação total e
definitiva. Não é uma revelação perfeita. Luthero conhecia o Deus construído e
herdado da tradição monástica e da piedade religiosa de seu tempo, desvinculada
e á parte das Escrituras. Um Deus criado e projetado segundo os ideais humanos
de justiça e perfeição, mas não o Deus das misericórdias e de toda consolação
(2 Co 1.3), não é o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o Deus da salvação
e da Graça. Até encontrar-se com este conhecimento, com esta verdade
libertadora das Escrituras, tendo a Cruz como declaração da justiça e da graça
de Deus, Luthero era um escravo infeliz na insana busca de conseguir o favor e
o beneplácito de Deus com suas obras humanas. Desta descoberta, mais do que
qualquer outra, resulta a Reforma Protestante. Não há verdadeiro culto a Deus,
aceitável por Ele, que comunique graça e santificação e não haverá vida
ética libertadora sem o verdadeiro
conhecimento do verdadeiro Deus das Escrituras. Todas as demais
conquistas e realizações da Reforma protestante: O livre acesso e exame das
Escrituras. O ensino fundamental público e a alfabetização das massas. A
iniciativa e o fomento do livre pensamento nas artes, nas ciências e na
religião. A democracia moderna com representantes escolhidos pelo voto do povo,
o valor ético do trabalho e a hipoteca social sobre as conquistas individuais e
etc. são na verdade o resultado e o produto derivado deste conhecimento de Deus
que dá ao homem uma cosmovisão bíblica, um sistema integrado de valores que o
possibilitam ver o mundo, a cultura, a
política, as artes, a realidade do homem na perspectiva da vontade de Deus e de
seu Reino sobre o universo. No final da vida, ao contemplar a extensão e todos
os desdobramentos desde o dia 31 de outubro de 1517 quando teria afixado as
suas 95 testes. Ao repassar a história e trazer à memória as extraordinárias
notícias que lhe chegavam da Berna de Beza, da Louvain de Farel, do Palatinado
alemão e da atuação de Melancthon. Da Genebra de Calvino, da Zurique de
Zwinglio e Bullinger e de todas as transformações que ocorriam em toda a parte
e em todas as dimensões da existência humana, Luthero teria dito: “Eu não fiz nada, a Palavra fez tudo.” É o encontro do homem, por mais
desesperado e atormentado, por mais pecador e por mais distorcido que seja até
então, seu conhecimento de Deus, que pode REFORMAR a sua existência e todo o
seu contexto. Se Luthero possui algum valor, serve de algum modelo e
inspiração para nós protestantes do século XXI, creio que é este. Deixar-se
convencer, seduzir, aguilhoar, ferir, curar, acorrentar e conduzir pela Palavra
de Deus e dela e somente dela haurir conhecimento verdadeiro sobre Deus, o
homem, a criação, a Queda, a Redenção e o destino último de todas as coisas. Como
Luthero, deixemos Deus ser Deus. Deixemos que a Palavra faça o que tem que fazer!
Rev. Luiz Fernando
- Pastor Mestre da IPCI
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